quinta-feira, 30 de outubro de 2025

Tem vários de você no bar



É que você sempre espera um boa noite de quem não te dá um bom dia. Você mandou tantos corações, músicas, poemas, fotos aleatórias para quem só queria brincar de ter alguma coisa.

Você foi rápido, se entregou, mostrou o coração, pensou que o mar era profundo, mas o barco não saiu do raso, fez força pra remar e não tinha mais ninguém lá, só suas emoções.

É lógico que ele sumiu, é lógico que demorou para responder todas as suas mensagens, estava tudo muito claro, você até sonhou... inacreditável, contou até pra ele. E ele? Riu. Covarde, só riu.

Você sempre dançou sozinho. E a sua música nunca parou de tocar. Outros iguais a ele, tem em toda esquina; cada encruzilhada que você passou, encontrou um dele em corpos diferentes. Ele é comum. Foi só mais um que tentou te enganar.

Ele é frágil, não aguenta uma declaração. Aquele típico "tipinho" que foge. Você ama e isso desencoraja pessoas vulneráveis, inconstantes, que não estão acostumados a receber amor, intenso, alma aflita que se declara.

Eu sei, você se sentiu nu, usado, com vontade de vomitar quando abriu seu mundo e mesmo de longe permitiu que alguém participasse. Você olhou para ele e riu. Naquela noite, sem que ele percebesse, você continuou dançando sozinho.

Encantando olhares, desviando dos outros, você se fez forte e girou. O passo mais perfeito da sua dança maluca, sozinha, engraçada, embriagada, feliz. Tem lugar que não te cabe, tem gente que não te merece. Que não é homem pra te fazer feliz. Que não é.

Você sempre foi assim. Você permite que partam seu coração; se refaz, se desfaz, e anota para não errar mais: reconstrói cada parte sua e ama, como ninguém faz. Você é gente demais. Ele se assustou. Contrariado.

Por favor, não pare a música, dance esquisito mesmo e contagie quem é capaz de te ver amanhecendo pleno, enlouquecendo, translouco, às vezes é só você e seu copo cheio, colocando o mundo no mudo, sorrindo à toa.

Ontem triste.
Hoje não.

Hudson Vicente.

sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Me esvaziei de você



Se você sentir saudade, me avisa.
Às vezes o meu sol é meio cinza.

Meu dia se colore, ao lembrar de nós, naquela noite, de madrugada, com você chamando meu nome;

de repente tudo virou azul, virou mar, virou céu, virou benção de Iemanjá, nosso orixá.

Mas não faça como fiz, lembra de não me apagar, feito as mensagens e textos intermináveis que te escrevi, quando faltou coragem da nossa parte de se declarar.

Te amei em pânico, quando avistei, você era só uma miragem que vislumbrei. Nós fomos frágeis e findamos. De repente ficamos em silêncio.

Todos esses dias, sinto tanta saudade assim. Nada nos salvou de nos tornamos dois desconhecidos. Chegamos ao fim.

Hoje o sol não saiu. Me tornei paisagem abstrata no seu diário de ilusões. Te escrever me esvaziou. Me sinto o mar de Copacabana em ressaca.

Essa é a hora que me encolho para sentir solidão. Ontem vomitei tudo aquilo que você me fez passar, fui cruel comigo, como o tempo.

Não gosto de falar mais sobre nós. Me deixou em estado de emergência num leito de hospital depois de secretas recaídas.

Agora não te amo. Em silêncio. O dia não tem cor. É um longo caminho de volta pro espelho. É um longo caminho, mais esse recomeço.

Se sentir saudade, me manda mensagem. Agora não, mas no futuro, quem sabe...

Hudson Vicente.

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Poemas mentem o tempo todo



A indiferença manda as pessoas para bem longe. Te escrevi pela última vez, já sem paciência para mais desculpas descartáveis. Você nem sabia que eu fui o último a desistir de nós, depois de você, é claro. Sim, porque você tinha ido embora, só não falou, nem se despediu. Foi embora mesmo, como em uma música sem palavras, sem agressões, sem toques, sem mãos. Confesso que também te deixei ir, talvez não déssemos conta do estrago, decidimos juntos (em silêncio covarde) que seria melhor assim.

A porta segue aberta para o futuro, se um dia se decidir o que sente por mim, vou te lembrar que me disse: "faça o que for bom pra você". Então fui embora, com o coração doendo, mas em paz. Porque não dá pra escrever uma história em cima de uma outra que não chegou ao fim. Eu não consigo. Quebra a narrativa, o roteiro fica frágil, o narrador se perde, os personagens se cansam. E nós cansamos. Deixei você viver sua mentira em paz (é a segunda vez que grito isso, perdoe-me a repetição).

O peito ainda acelera quando te imagino, mas eu não caibo no seu diário secreto de indecisão. Ou faz ruído ou o vento me leva sobre às águas para trombar em uma cascata. Fui tremendo, em outras palavras, costumo dizer.

A gente só não enxerga o que a gente não quer. Quis escrever uma frase de sentido contrário, fui traído pelo meu autor favorito. Os poemas mentem desesperadamente, o tempo todo, a agonia dos poetas.
Vou lembrar da gente como barulho de mar, e estamos de ressaca agora. Vou rezar pra não me apaixonar de novo por nós.

Era linda a rouquidão que saía dos seus pulmões soprando delírios de um coração de papel, nos meus ouvidos.
Sonhei tanto com o futuro que a gente tem agora.
Não era pra ser.

Se o vento me levar, eu assopro. Não é todo mar que caio (mais).

Notas de rodapé: talvez eu esteja mentindo quando digo que é a última vez que escrevo pra você. Eu sou uma farsa. Meus sentimentos me traem. Escrevo até parar de sentir. Mas quero te libertar daqui, onde foi cigano, não fez morada. Breve como quis ser. E foi feliz no meu tempo livre. "Várias queixas de você... por que fez isso comigo...?"

Hudson Vicente.

segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Incontido como o mar


Não sonhei com amor

Não sonhei com leões; sonhei com gatos, com cobras, memórias tristes, gente indo embora, felizes; aviões não caíam, tinha tempestade, quase chovia, fechava as janelas das lembranças e só tinha o céu, em acalanto.

O mundo todo com pressa, a gente gozando, prometendo o fim da guerra, vinhos e sonhos; lembrei de putas tristes, frio nas costas, guimbas de cigarros, sua voz doce e rouca, me espalhando no cobertor, na cama.

Mas segundas-feiras são só desculpas que a gente dá para arrumar a vida, diminuir a bagunça, acalentar as ressacas, a esbórnia ter fim. Por que você disse a porra do te amo? Não é amor. Quem sou eu pra definir sentimentos alheios? Mas não é justo comigo.

Desculpe, não é amor. Ninguém que gosta de você vai te deixar em silêncio, vai te deixar no vácuo, vai esquecer de se lembrar de você. Não dá pra gente acelerar o tempo. Pular etapas. Eu sei, não tem uma regra, nem linha cronológica. Afeto é só questão de existir. Mas não é amor.

A gente nem viajou, não sonhou acordado, não ficamos até tarde sentindo tédio um do outro. Eu nem te fiz a massagem que te prometi desde o primeiro dia. Por culpa sua, é verdade. Me enrolou e só queria me comer. Te amar foi bom. E eu te amei. Mas não é amor.

Procurei tantos motivos pra te fazer ficar, que até esqueci que prometi não amar mais ninguém. Não posso te dar o que ainda não tenho. E você sabe que não é amor. Eu respeito bem minhas fragilidades, antes de tudo, minhas vulnerabilidades. Consigo ser seco feito um jogo de futebol russo, mas queimo por dentro sem explodir.

Não tem como eu contar tudo pro meu terapeuta, as vinte e quatro horas de montanha russa que a gente percorre. Eu amo seus olhos sorrindo pra mim, somos dois estranhos, clandestinos que prometeram se amar. Mas não se amam. Porque você é jovem demais. Eu sou intenso demais, problema demais. Nossas águas escorrem em oceanos opostos, que quando encontra o rio, nos afastam e seguimos caminhos distintos.

Nunca menti pra você. Sou uma bomba. E agora, eu não me recomendaria nem ao meu melhor amigo. E só ele sabe o que acontece quando o mar está agitado. Ninguém ama minha renúncia. A minha sentença é solo. Entende? Nós não somos feitos para o mesmo mar, mas é claro que podemos nos divertir. Quando você se decidir. Tem amor que é quase impossível.

É fácil gostar de você. É fácil me encontrar deprimido. Eu me visto de azul, me camuflo em tons alegres, cara fechada e coração difícil de ser penetrado, quem fica um pouco, percebe que é só fachada. Tudo para esconder que não se entrega rápido demais. Você seria capaz de se apaixonar por mim?

Não, não é amor.

Eu agora quero falar de paixão.

Por paixão a gente também fica. A gente se declara, arruma briga e se separa. Mas tem que estar disposto.

Estou cansado de desfazer fantasias.
Acolhe meus dias tristes?
Te escrevo todos os dias.
- É a minha forma de dizer te amo.

Mas não é amor.

Preciso agarrar minhas sombras, se decidir ir embora, até prefiro que seja agora. Não vai doer tanto.

Te olho como o Pequeno Príncipe olha para rosa dele. É meu encantado. Corri o risco de chorar um pouco, desde que fui cativado. Dorme no meu abraço de novo, pra sentir o amor que nunca te deram. Eu não vou desabar.

Acabaram meus comprimidos, dessa vez, sem desmoronamentos.
Ah, e vê se não esquece de ser brilhante!

Hudson Vicente.

quarta-feira, 24 de setembro de 2025

Recaída


Não eram dias perfeitos.

Dormia e acordava, nem dava conta das horas; no olho, pupilas dilatadas, tentando se encontrar. Não tinha mensagem. Mas tinha gatilhos, muitos, todos em volta para te atacar.

Criava histórias que nunca saíam da sua imaginação. Observava o outro vivendo sua mentira, enquanto vivia o próprio calvário. Pensava o tempo todo em acabar com a brincadeira. Adorava se torturar vendo o outro fingir, manipular, dissimular.

Não vai beber? Ignorava todos os sinais. Estava tudo tão claro. Tão jovem, tão sem governo, mas disse que te ama.
Bateu. Acabou com você. No pior momento. E você acreditou. Ele te ama e está dormindo com outro. Planejando a vida, te cozinhando enquanto você mal tem vontade de levantar da cama. Mas levanta, respira fundo, sem drama.

Reconhece seu papel, o seu lugar, ainda confuso. Contraditório. Vulgar. Dessa vez é diferente, vocês não precisam trocar mensagens escondidas de madrugada. Mas ele some. E depois volta com olhinhos brilhando, é dócil, é amável, como você gosta.

Quis tanto o amor que agora aceita do jeito que vem. Ele te ama, mas dorme com outro. Na cama em silêncio, fazendo barulho, falando com você. O vento sopra e você outra vez se sabota. Criando história em cima de uma história. Gosta de se mutilar.

Ele é exatamente intenso como você era. Há dez anos atrás. Te fascina. Te ganha. Te encanta. Te traz vida. E você que suspira solidão, deprimido entre o álcool e comprimidos, voltou a sentir tesão.

O coração acelera, a música não toca. O bloco não sai. Ignora os sinais. Quando desencantar, vai olhar pro espelho, vai dizer quem é você, soltar suas águas de volta pro mar. Lá você aprende. Ou nada ou afunda. Você é imenso agora. Sem revolta. Você ia tão bem...

Hudson Vicente.

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Um peso chamado eu


Pode ser cruel isso que vou te falar, mas eu não sou o que as pessoas procuram.

Sou aquele tipo de pessoa que não preencho as expectativas de ninguém. Sou sempre aquele que sobra, que é escolhido por último para fazer parte dos grupos, quando já não tem mais boas opções, isso desde a escola, depois na faculdade, agora até em certos grupos de amizade. Parece que não preencho o requisito.

Sou aquele que nunca é suficiente pras pessoas. Com isso, tive que aceitar e me encarar, era assim. Também não era suficiente pra mim. Nunca inteiro, sempre uma parte, remendada. Sempre uma sobra, uma falta que não faz falta.

O olhar de inconformismo das pessoas, da falsa aceitação, tive que lidar a vida inteira com isso, até aqui. Doeu em cada ponto. Fui programado a duvidar de mim.

Então, se você chega agora e me diz que eu não sou isso, desculpa, não vou acreditar, não é assim.

Ainda vai levar um tempo para eu não me encaixar na prateleira secundária das pessoas.

Sempre achei que pegavam pesado comigo, mas jamais tive força na voz para contrariar. Aceitei um jogo do qual não tive escolhas, embora conivente. Me deram esse papel e me fizeram acreditar que eu era só mais uma opção, nunca a prioridade.

Não quero que sintam pena de mim, quero que me respeitem. E tenham paciência, porque agora, preciso me acolher primeiro. Entender que sou suficiente. Parar de ser cruel.

Benevolente.

Hudson Vicente.

quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Quase perdi esse texto



Me empresta seus ouvidos 
por alguns segundos
te falo sobre borboletas
a flor que se aprumou

ganho sorrisos largos
escuto alguns silêncios
quase me destroem

passo as mãos nos teus ombros
cansado e beijo um, depois o outro
posso te sentir arrepiar
eu também fico enrijecido
paro um pouco, mas não paro
ganho outro sorriso
te beijo

ouço atentamente seus sonhos
me esqueço por alguns detalhes
deito agora no seu colo
feito laços, não desamarro
nem desgrudo do seu cangote
é meu cheiro favorito
junto daquele que a gente faz
quando minha pele está sobre a sua
suando, deslizando, em transe

você me dá tempo
te preencho com minha vida
e em abraços repetidos
refletido da fotografia que nunca postamos
há quem veja e se assuste
e há nós que ama cada gesto

tanta vontade de passar a vida inteira assim
construindo memórias fora da nossa imaginação
agora o caos cessa
o dia pede licença para a noite
e dura uma eternidade quando estamos a sós
você e eu

foi muito bom te ver chegar
não quero saber que horas vai embora
não agora que perguntou se queria ajuda para me curar
quando for (inevitavelmente)
vai de mansinho
só pra eu não sentir mais dor...
(nessa parte do caminho)

Hudson Vicente.