quarta-feira, 30 de junho de 2021

Um Pierrot alucinado


Um momento de fuga, meu instante de felicidade, descarrego a ansiedade nos estalar dos dedos e no balançar de pernas e pés, aflitos.

Não desce mais um gole de álcool, me enjoa, enoja, me leva pra um lugar de dor, ruim, rejeito. Tenho horror à fumaça, ao cheiro da vida adulta; passo o tempo me relendo, me reinventando, desabrochando meus dilemas, desafogando meus poemas, minha confusão, meu lar.

Tenho queda por gente simples, complicado sou eu. Nunca sei me decidir o que eu mais quero comer. Por insistência, faço escolhas erradas e não me defendo. Deixo que escolham por mim, assim, o gosto do fracasso é compartilhado.

Escrevi um monte de histórias em que todas me salvei, essa não. Talvez eu tenha tendência em exagerar. Perdi a conta das brigas que me calei e fui nocauteado pelos meus próprios sonhos. Estou em constante inconstância.

Hoje beija, toca, trepa, troca, goza, dorme de conchinha e amanhã meia dúzia de frases feitas como respostas, reduzidas em não incomodar. Não incomoda. Tira a corda do pescoço. Pula do penhasco, não chama de amor.

Aos outros, ensejo. Por horas, fui acolhido, acalentado, me beijaram a testa, a face, a boca, me chuparam. Eu correspondi. Fui poesia do coração pra dentro. Tesão, sexo e pizza, da língua pra fora.

Às vezes a pele ao ser tocada, só precisa ser tratada como pele. Sutil. Gozar é o brinde da alma (quase) nunca tocada.

Em tempos: transbordei. Amanhã ou depois eu volto a ser triste. Hoje não... ando muito cansado. Fraquejei. Depois de tanto tempo, o afeto salva a gente.

Hudson Vicente.

domingo, 20 de junho de 2021

Há versos que precisam ser escritos


Sempre discordo do dia, pergunto que cara ele tem? Se ontem não foi hoje, por que não escolher semana que vem? Os dias tem tamanhos distintos, eu também estou aqui pra discordar, não achei meu lugar. Em casa? No trabalho? Na vida.

E não há quem me compreenda, a conta do analista sempre chega no final do mês, quem paga esse preço sou eu por precisar de alguém para me dizer quem sou, sem parecer um monstro calado no reflexo do espelho, à sombra disso, parece tudo remendado.

Taco pedra no espelho, não me vejo, estilhaça os vidros no chão, não me vejo mais inteiro. Seria só mais um borrão? Meu maior talento é falar sozinho o tempo todo. Já não tem mais o espelho, ninguém mais responde. Posso não estar louco. Ou nunca mais me curar de mim mesmo.

Estou doente? Que bobagem, foi só mais um espelho dos mais de vinte e sete que já quebrei. Se somar tudo, dão mais de três vidas de azar. Mais de três vidas? A minha única, só, eu já não aguento.

Que dia é hoje? Vou discordar, eu não caibo mais nesse lugar comum.
Há versos que não precisam ser escritos por poetas.

Hudson Vicente.