sexta-feira, 26 de agosto de 2022

Quando nossos corpos viraram um só


Não coube dentro de mim
Mas não desabei
Foi surpresa: desaguei
Precisava transbordar

Foi lá, foi cá
Que o mar me trouxe
Chacoalhando bastante
Era só um rio
Me tremendo de frio

No espaçamento entre dois corpos
Não chegava uma decisão

O prazer do mar é ser profundo
Do poeta é emergir
Se perder na imensidão do azul
Quando no final da paisagem se confunde com céu
Relampejava de longe, tempestade

Com desdém a língua cuspia o ódio enxarcado de desencontro
Quem de nós era o infinito?

Reviraram-se os olhos
Suspiraram de longe
Gemia o canto do desprazer de não aprender o nadar

Ninguém ensinou
Onda grande se enfrenta mergulhando
De frente
Mesmo não cabendo
Não sabendo aonde vai dar

Amei de longe a paisagem que se formou sobre nossos corpos amontoados
Ainda suando frio
Tremendo no chão

Qual a sensação de estar por dentro de mim?

Quando nossos corpos viraram um só, você chegou lá?

Hudson Vicente.

terça-feira, 16 de agosto de 2022

Alguns encontros a vida evita


Eu era doido pra gente se encontrar de novo.

Sem hora marcada, sem desculpa esfarrapada, sem essa de deixar para depois, o que a gente podia fazer agora.

Queria não ficar te escrevendo e apagando, com vergonha, com raiva, com desespero, com alento, com pena. Com pena que nossas vidas nunca mais foram as mesmas. Que nossos caminhos nunca mais se cruzaram. Com o receio de pensar que você pode estar me evitando.
Eu até aceitaria o fardo dessa verdade escrita em caixa alta acompanhado de um sutil "me deixa, esquece e vamos vivendo".

Eu queria ser assim, independente. Ser menos persuasivo no sentir. Sufocar menos, sem melodramas, ser menos dependente emocionalmente de tudo aquilo que me afeta, que me esbarra e explode. Parece que comigo tudo é muito raso ou muito profundo.

Você tinha que ver quantas coisas eu salvei e deixei guardado pra te mostrar, quantos livros, fotos, textos, frases eu separei para a nossa próxima conversa. Está tudo arquivado aqui nesse contato frio que a gente mal tem.

Impressionante, não desenvolve. Me sinto aflito de pensar, eu nunca vou me declarar, escrevo esse texto pra depois apagar, ou talvez salve e nunca te diga.
Se me ler, se não me evitar, talvez pergunte para quem foi. Eu juro que vou disfarçar e dizer que apenas senti e me entreguei. Não é sobre mim, não é sobre você, embora seja sobre nós. O que não somos. O que não fomos. O que o tempo não deixará ser.

A vida é mesmo assim, esfria o que queima por dentro. E não transborda onde não cabe. Eu tinha tanta coisa pra te dizer. Tantos porres para dividir. A minha hora nunca chega.

Alguns encontros a vida evita, tem seus motivos.
Poderia ser espiritual, mas vamos deixar para lá. Vamos continuar nos enganando, adiando o nosso depois, marcando pra outra vida, quem sabe...

Hudson Vicente.

sábado, 6 de agosto de 2022

Insônia ou ansiedade?


Fiquei acordado até tarde.
Não vi o sol nascer, enquanto me revirava solto numa cama com espaço tão grande que mal cabiam meus pensamentos.

Ansiedade não deixava o corpo relaxar, o dia foi nascendo meio estranho, estava claro mas não se via o sol, talvez ele também tenha se cansado de amanhecer e ficou ali, paradinho, deitado entre nuvens.

O vento batia e tremiam as janelas, me agonizava. Já estava tarde demais para dormir, cedo demais para acordar.

É uma droga, estava convencido de que precisava de colo. A natureza não ia dar, ninguém podia dar.

Vencido pelo cansaço, apaguei. Não dei mais conta de mim. Os comprimidos  acabaram, a vida me acelera enquanto estou em pausas. É exaustiva essa espera, mas, espera pelo quê?

Antes fosse ressaca...

Hudson Vicente.