quarta-feira, 17 de abril de 2019

Grito

Carta:
Com licença, te escrevi uma carta:
Se você vier depressa e me impedir de pensar, de me fazer voltar, talvez algo possamos mudar.
Se você voltar e me impedir de dizer que eu vou me matar, talvez algo possamos mudar.
Se você sentar do meu lado, e um silêncio corrosivo entre nós se manifestar, e você disposto a quebrar o gelo, me abraçar, talvez algo possamos mudar.
Se você falar pra eu perder meu medo e me der a sua mão, talvez algo possamos mudar. A gente pode até dançar.
Se você falar pra eu levantar, e caso eu não consiga, você me ajudar, talvez algo possamos mudar. Eu vou te acompanhar.
Se você falar pra eu esquecer meu passado e viver contigo o agora, talvez eu esqueça o mundo e fique para sempre, seja lá o que isso significa, com você no presente.
Mas eu não estou te cobrando nada. Eu só não estou bem. Talvez daqui algumas horas passe. Ou eu piore. Ou eu realmente morra. Ou você desista de mim. E a gente se perca de vez como um rádio velho em alguma estação.
Se ainda eu estiver por aqui e perdido, e você não tenha feito nada, eu só te peço: não chega mais perto. Me assiste de longe, indo embora da sua vida. Pois continuarei a caminhar, até eu me encontrar.
Quem vai me salvar?

Resposta:
Não me cabe agora escrever sobre o amor. Não me cabe agora falar em solidão. O que ele precisa mesmo é gritar. Alto. Bem alto. Mais alto. Explodir. Só me cabe agora te ouvir. Bem atento as suas respirações. Concentrado em suas falas. Não perder um gesto. Entender o motivo de suas lágrimas. Acolher seu abraço, te deixar no meu colo enquanto o soluço ainda se faz presente. Tentar, mesmo que inutilmente, que suas tristezas sarem. Sei que você espera muito do mundo e quero que não se sinta só. Sou teu porto, teu cais em meio ao caos. Queria que hoje o mundo não fosse cinza, que não estivéssemos numa quarta-feira. Talvez sexta fosse propício, assim você sentiria vontade de sorrir.
Embora o relógio demore a completar seu percurso e cada segundo pareça uma eternidade, gostaria que tudo isso que você está sentindo agora, abandonasse seu corpo. Gostaria de verdade que algo de muito grande, partisse. E não fosse você.
Calma, respira suavemente. Se doer, pode apertar minha mão. Deixa eu virar seu lar. Abre os olhos e me encara, só não se entrega, por favor. Grita. Eu vou te ouvir. Não vou te deixar partir.

Hudson Vicente.

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