quarta-feira, 18 de setembro de 2019

Epílogo

A gente vira adulto e não cresce.
Não dá mais pra voltar. Não tem mais colo de pra deitar, carinho na cabeça lá pelas quatro da tarde, quando o chegava da padaria, ofegante, tirava as sandálias e nas mãos trazia os pães fresquinhos pra comer e tomar café. Meu avô era legal, às vezes era chato, ria bastante das pegadinhas da tv, minha vó era um doce, fazia cocada e sacolé, tinha mão boa pra afagar. Vou sentir saudade disso tudo. Das minhas birras intermináveis, do forró do vizinho do lado, do canto da cigarra às cinco e quarenta e seis da tarde, na árvore de trás do quintal. De subir no telhado e pegar a bola, aproveitar e roubar manga que caiu da árvore.
Olhei pros meus tios e primos e não os reconheci, mas nada mudou, eles também não cresceram. Será que eu vou ser assim também? Esquisito...
Meu pai parece que já foi embora, minha outra mãe do meu pai, ainda sorri bonito feito uma índia, elegante, inspiradora. Jamais vou esquecer teu choro, Iara, tinha nome de sereia, era da mata. Queria abraçar todos de novo como nunca mais abracei, queria perdoá-los e me desculpar, eu nunca soube quem eu era. Agora parece tarde, adulto sente tudo. Muita solidão e poucas alegrias. Crescer é triste. Por isso ninguém nos contava quando criança. Não tem brilho nos olhos.
Minha irmã, meu orgulho, a maior de todas, a favorita deles, acrescentou, trouxe mais um príncipe, tão pequenino, vai ser mais feliz que eu. Minha mãe bateria na minha boca e enxugaria minhas lágrimas, quando dissesse isso. Aquele menino vai ser muito melhor que eu, eu fraquejei. Ele não vai. Um dia vou poder dizer que tentei.
Eu nunca quis morrer antes. Talvez nem agora. Mas nada faz mais sentido. O que estou fazendo aqui? Aos pouquinhos o menino está indo embora. Eu já morri. Não tenho mais o que sentir. Só sinto saudades. De tudo. Do que eu não fui e poderia ter sido. O menino está cansado. Não estava preparado pra essa vida tão cedo. Sem estruturas. Não quero culpar ninguém. O fracasso pode chegar para todo mundo. Até um grande poeta voo. Aos meus amores, sinto muito, minhas asas quebraram, vazio enorme, sem amor.

Hudson Vicente.

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