quarta-feira, 17 de julho de 2019

Se te excluí foi pra te proteger

Vi um menino sentado no banco de um parque, era diferente dos outros meninos. Não chutava bola, não fazia pirraça, não corria atrás de outras crianças, não tinha amigos, não se enturmava. Mexiam com ele, não ria. Esbarram nele, se afastava. Tinha medo do toque, de abrir a boca. Uma menina puxou suas mãos para brincar de roda, não aceitou, sem graça. Quando olhava pro céu parecia contar as nuvens, sentia paz, acho que queria ser passarinho, acompanhava cada voo. Perdia de vista um por um. Passarinho esconde seu ninho. Detestava quando arrancavam flores da árvore. Na Terra parecia seu purgatório, queria fugir pro céu, até que ficaria bem entre as nuvens. Teria o céu só pra ele. Que egoísta. Tua liberdade era solidão.
Não parecia ter pai, não parecia ter irmão, não tinha nem a cara da mãe. Fingia alegria em sentir o vento balançar as árvores e suas folhas caírem sem alarde. Lento como o tempo. Passava a tarde assim. Não falava, não ria, não existia. Não sabia seu nome, só gostava de voar, no seu íntimo deveria ser algum Rei, Príncipe, que seja. Seus olhos brilhavam para os grandes carros que atravessavam a avenida em volta. Não tinha muito dinheiro. Comprava uma pipoca, dividia com um cachorro. Coração batia. Nunca deve ter vivido uma grande folia. No carnaval deveria se trancar em casa ou somente se vestir de bate-bola. Irreconhecível, sempre despercebido. Menino nunca sorri. Sempre conformado, parece que não gosta de existir. Existir dá trabalho, cumprimentar as pessoas, desejar bom dia, perguntar como vai, com a possibilidade de começar um diálogo a partir daí, se aprofundar em algo que não se importa. Parece um espelho quebrado. Parece eu sentado na praça. Minha juventude. Parece eu aquele menino. Se te excluí foi pra te proteger. Aquele garoto sou eu, bem sentado ali. Me deixa aqui.

Hudson Vicente.

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